28 de novembro de 2010 0 comentários

Um pouquinho de mim

Acordei tarde, dolorid e ainda beirando a exaustão. Os cabelos revoltos como a muito não os via, mas preferi deixar assim... me olhei no espelho por alguns segundos: diferente. Ver e não se reconhecer, de repente tive saudade de mim, do que eu via no espelho e nunca gostei. Tive saudade da calma, da persistência, da fé nas pessoas, no mundo, saudade dos sonhos e de correr atrás deles como se estivesse bem aqui, bem ali, ao meu alcance...
Disso tudo, quase nada restou... E de repente, fiquei tão triste como se tivesse acabado de perder alguém importante e foi um vazio tão grande que parecia mastigar as minhas entranhas...
Não há mais volta isso de crescer, amadurecer, se aborrecer, magoar, se ferir... Vamos enterrando o melhor de nós impiedosamente, jogando os sonhos em qualquer buraco e os escondendo com mais e mais areia...
Já sei do que tanto sinto falta nessa casa vazia: sou eu. Sou eu que não entro com pressa, com as roupas sujas, a cabeça fervilhando, o coração pulsante e a certeza persistente de estar fazendo a coisa certa... Sou eu que não faço um café no fim da tarde, espalhando livros pela sala, pelo corredor, tropeçando em tudo e me repreendendo interiormente, como se repreendesse uma criança travessa, a respeito daquela bagunça toda...
Sou eu que não encho mais a casa de amigos, arrisco escrever poemas torpes e discursos carregados de sentimento....
Ah o sentimento! Sou eu que não escrevo mais cartas apaixonadas, não persigo mais o amor como se fosse a única coisa que valesse a pena em meio a toda essa falta de... tudo!
E é por isso que ninguém mais vem aqui... nenhuma mais consegue entrar pela janela e tomar de conta de toda a casa, mudando os papéis de lugar, me fazendo confundir os tinteiros... Não há ninguém que me ouça enquanto teço teorias mirabolantes sobre as pessoas, os sentimentos e o destino, tão atenta como se entendesse cada palavra, como se sorvesse cada idéia... Nem ninguém que me convide para dormir, ralhando por estar tarde e eu ainda trabalhando, mas quando me deito, também não me deixa dormir porque precisa ser amada, acalentada, mimada ou repreendida...
Não há mais nada além dessa falta de mim.
23 de novembro de 2010 0 comentários

Um tratado sobre a histeria

É noite e mais uma vez a varanda é meu refúgio. Não porque me incomoda a solidão e o silêncio da casa, porque hoje é exatamente assim que Bloco de textoeu gostaria de estar: sozinha, com a cabeça borbulhando pensamentos.
Será verdade isso de que as pessoas mudam? Que mudam sua forma de pensar, agir? Biologicamente isso é perfeitamente possível com todas aquelas explicações sobre adaptação, seleção natural. Assim, as mutações seriam perfeitamente viáveis, na verdade, necessárias para a perfeita adaptação ao meio.
A verdade é que não entendo nada de biologia, mas compreendo que eu mudei... tão certo que mudei que ontem mesmo me incomodava profundamente a solidão, enquanto hoje agradeço silenciosamente por ela, por não ter que fingir sorrisos ou aturara conversas enfadonhas.
Mas uma mudança muito mais profunda vai se operando em mim, dia após dia, num exercício cotidiano de "adaptação" a doença incurável que se alojou em mim. E ainda há quem acredite que que não há males que vem para o bem.
O primeiro passo disso tudo é a negação: você não quer acreditar/aceitar que está infectado por aquele flagelo da... histeria. Imagine que você esteja há muitos anos tentando andar com as próprias pernas, aprendendo a respirar enquanto todos os seus sentidos entram em colapso, bravamente resistindo ao conflito entre a razão e os sentimentos, que te fazem confundir a realidade posta, com a realidade hipotética.
E se a batalha diária para não se deixar cair no abismo acaba com uma simples constatação: que você já está nele, caindo, afundando e perdido. Este é aquele momento em que os médicos te desenganam e tudo que lhe resta é fechar os olhos e rezar: que eu não sinta dor ao final.
Depois de constatar o inevitável dois podem ser os caminhos: acelerar a queda ou retardá-la. Há quem faça um pouco dos dois...
O que há ao final da doença incurável? A morte. Não há escapatória, senão através de um milagre ou de um avanço sem precedentes da medicina. Então se no final do abismo, tudo que resta é se estatelar em milhões de pedaços, que seja breve. Então você fecha os olhos e acelera a queda, se entrega a intensidade das sensações, que mesmo fugazes e findas lhe satisfazem como nunca nenhuma outra satisfez. E voi-la! Você no fundo do abismo, em centenas de pedaços. No dia seguinte se perguntarão: o que será que ele sentiu quando seu crânio foi comprimido pelo chão áspero!?
Aos menos corajosos restará a tentativa vã de se agarrar a algum galho, pedra, ou qualquer coisa que lhe retarde a queda... - mas isso de coragem temos que discutir numa outra ocasião, porque é bem verdade que coragem, as vezes, se assemelha a burrice e covardia, a prudência...
Sim, mas falava daqueles que se agarram a doses homeopáticas de emplastos que não agem senão nas suas próprias consciências num movimento reverso de... desengano. Estes são os que não se entregam tão facilmente, que insistem em lutar contra o inevitável acreditando cegamente numa possibilidade de "cura". Dois caminhos restam a estas pobres criaturas: morrer tentando, cansar e se permitir, mesmo já bem perto do fim.
Dessa segunda hipótese é que nasce o terceiro passo, para aqueles que não morrem tentando, restará a "revelação", aquele momento muito perto do fim em que tudo lhe parece extremamente claro e simples, onde se percebe que entregar-se não tem nada a ver com escravizar, que compartilhar não significa dar tudo, tampouco apenas receber, mas especialmente uma troca constante onde se dar o que pode e recebe o que puder aguentar. Percebe, ainda, que a lealdade não é sinônimo de fidelidade e que confiança não se constrói de promessas feitas e cumpridas, mas de atos realizados, nunca prometidos, cobrados ou barganhados... Se descobríssemos isso a tempo quase não precisaríamos nos preocupar com a "queda" porque viveríamos num estado suspenso, etéreo, da mais extrema "realidade", com todos aqueles sentimentos te inundando na medida certa e se esvaindo no momento exato.
O problema é que a descoberta quase sempre vem tarde demais e se você ainda não se esborrachou, está bem perto disso e são muito poucas pessoas que conseguem mudar a tempo. Sim, mudar, se adaptar ao abismo e doença incurável, se acostumar com o inevitável, assimilar e compreender a "revelação".
Não sei exatamente se no meu caso tem abismo, mentira! Tem abismo, doença, sensações superdimensionadas. A minha única certeza: o fim, meu ou da doença, o fim. Forçoso as coisas perecerem, elas mudam ou se transformam... o que seja!
A assimilação é um exercício diário, um controle sobrehumano de pensamentos e sentimentos em busca da medida exata, para aprender a conviver com o inevitável, o incurável que não tem nada de IN, a não ser a forma irracional com a qual as vezes insistimos em encará-las.



21 de novembro de 2010 0 comentários

Um dia de cada vez

Ópera. Tenho escolhido ópera pela intensidade, pela maneira lenta, constante e transbordante que ela vai preenchendo o vazio da casa... Todas aquelas vozes, aqueles instrumentos vão me dando a sensação de que não estou só...
Consegui acordar cedo, ir a feira, ler, ler e escrever. Hoje é um daqueles dias em que a balança está lá em cima sem causa aparente. Quando acordei pensei que teria todos os motivos para me afundar na tristeza, mas em vez disso eu levantei... Resolvi me contrariar e não me irritar com o inevitável, porque oras... eu sabia que isso uma hora iria acontecer... Só não deixo esses discursos de "eu quero a sua felicidade" tomem conta de mim, porque isso é hipocrisia demais... Mas sei que consigo lidar com isso. Eu só preciso de um pouco mais de paciência... dessa que eu cultivo bem aqui no quintal...
Venho pensado em motivos para seguir em frente, na verdade mesmo, eu gostaria de motivos que me fizessem esquecer... mas isso é como uma doença incurável, você só pode esperar que ela tome conta do seu corpo e se acostumar com os comichões... Mas nunca é demais rezar por um milagre. Enquanto isso, faço de conta que não há doença alguma, que posso sair por ai correndo bem rápido enquanto a brisa tenta tocar o meu rosto, para no final, quando o ar me faltar eu apenas respirar, bem fundo, bem devagar...
A maioria das óperas são tristes, parei para pensar nisso agora, no quanto está soando triste a voz daquela mulher... Mas eu não quero saber de tristeza hoje, então fujo para a varanda. Ao longe ainda consigo escutá-la, mas agora sooa engraçado... Engraçado mesmo é como tudo pode mudar assim, dependendo do referencial...
Por isso agora vou começar meu próprio jogo do contente: todas as vezes em que a tristeza vier me visitar, com seu ar sombrio e gélido, eu vou fugir para a varanda, olhar para o céu e pensar em... possibilidades. Exatamente, possibilidades, tão vastas, incontáveis e nada palpáveis como todo o céu, as estrelas, as nuvens...
Devo estar parecendo louca, aqui na varanda, falando sozinha, sobre céu e derivados... Mas a loucura é também uma possibilidade, e ela tem me parecido mais viável que a Tristeza...
20 de novembro de 2010 0 comentários

Divagações matutinas

Lembrei de Tomas olhando aquele muro, do outro lado da rua, decidindo se trazia ou não Tereza para sua vida, sopesando os prós e contras de trazer aquela mulher para a sua casa, ter que dormir com ela, senti-la apertar a sua mão possessivamente enquanto dorme... Tomas sequer tinha uma cama... "Olhava para as paredes sujas do pátio e percebia que não sabia se aquilo era histeria ou amor"
Deve ser histeria... imagine essa quase necessidade de ouvir a voz de alguém, de querer estar perto sentindo apenas a sua respiração ou vendo seu sorriso despontar... e esse sentimento de proteção absurdo, esse querer bem...
Sim, mas eu fala de Tomas e Tereza, não de mim...
18 de novembro de 2010 0 comentários

Algumas palavras

Como explicar essa solidão incômoda que me acompanha passo!? E essa inquietude que dia sim, dia não resolve se abancar no meu sofá exigindo atenção, resmungando pensamentos desnecessários?
Por mais que eu tente não consigo me acostumar com os móveis, parece que tudo está fora do lugar ou parece que tudo foi comprado ontem ou ainda, parece tudo velho e obsoleto... É tudo isso em um segundo apenas...
Vai ver esse corpo nem é meu, nem nada disso que me rodeia. Vai ver eu acabei de acordar e ainda estou meio atordoada, tentando reconhecer tudo, tentando lembrar onde estou, mas não consigo e me resta uma enorme dor de cabeça que vou tratando com cochilos matinais. E enquanto eu durmo sonho com um mundo diferente desse, onde me sinto confortável comigo mesma e o violão não desafina...
Então solidão é isso... acostumar-se consigo mesmo e com os ecos dos seus próprios passos na casa vazia!? Gostaria que alguém viesse me visitar, que conversasse comigo a tarde inteira sobre essas colinas, sobre o sabor do café, sobre a casa que precisa de reforma, sobre essa angústia... Mas não adianta, o tempo passa, o pó assenta e a porta continua fechada, muda e fria.
1 de novembro de 2010 1 comentários

Incômodo

Voltar para casa e essa sensação de que nada mais ali te pertence, é estranho... Não é mais sete da manhã por aqui... agora é sempre cinco da manhã e todas essas cores entre a noite e o dia, outra coisa com a qual preciso me acostumar...

Não sei, mas sinto como se tivesse acabado de voltar do exílio, ou de um coma profundo, ou de uma longa e tenebrosa viagem e embora tudo aqui me pareça familiar, quase nada me tranqüiliza... Nem a música, nem os livros, nem o sofá e os cochilos de começo de manhã.

E para completar esse retrato que fica me fitando de dentro da gaveta, como se de fato pudesse me ver e me esfregar a verdade na cara... A gaveta nos separa, minha querida, nos separa, nos protege...

Novas canções alternam com os antigos sons. Estou pensando em trocar o sofá por uma rede no quintal e também esses livros, são muitos e estão empoeirados, precisam urgentemente achar seus donos, aqueles que vão lhe devotar por toda eternidade... Eu já aprendi que não preciso de tanta coisa assim para sobreviver, só o que consigo carregar... Me acostumei até com o silencio, mas não consigo lidar é com essa solidão...

E eu que pensei que havia superado, me vejo superada...

 
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